Como quem assinala a caneta florescente uma ideia que quer ver rapidamente sair do papel, Andreia Garcia dá especial entoação à palavra 'intergeracional'. Com voz rouca mas enérgica, conclui a mesma linha de raciocínio 'A UNICA é uma universidade intergeracional'. E nem por acaso, salta para o colo da avó Rosa uma pequenita de camisola aos laçarotes e pergunta 'o coro da UNICA pode ir à minha escola?'. Esta cena podia constar no guião da telenovela do fim da tarde mas revela-se espontânea. O cenário é uma sala repleta de professores, que em torno de uma grande mesa, tomam conhecimento das actividades da UNICA - Universidade Intergeracional do Concelho de Almada - para 2016/2017.
A 3 de Outubro começa um novo ano lectivo, motivo pelo qual o corpo de formadores marca presença na Associação de Moradores do Pinheirinho. Mais de 20 professores, muitos deles alunos noutros disciplinas, oferecem os seus préstimos, voluntariamente, a favor da comunidade da Charneca de Caparica e arredores. O encontro tem uma agenda pré-definida, um programa que deve ser cumprido, mas o entusiasmo atrasa parte da planificação. O momento é de partilha, e contam-se breves episódios , criam-se laços.
Eduardo Matos que lecciona desde o ano passado a disciplina 'Ser Português' lembra que nunca termina as aulas à hora pretendida. Numa sala geralmente preenchida, o professor Eduardo gosta de lançar temas que suscitem a discussão, e há conversas tão acesas que por vezes migram para a mesa do café. A professora de Francês, Maria Luísa Laboubh, admite ter redefinido parte das lições em prole do melhor aproveitamento dos alunos, e desde essa altura também as suas aulas passam a voar, e muitas vezes terminam na mesa do café.
Menos expansivo, José Fernandes, fala da sua disciplina com reverência, diz até que o assunto pode ser indigesto ou incómodo. Gera-se um burburinho na sala, tanto mistério, afinal de que tema se trata? Teresa Matos mete atempadamente a colherada e incita José a revelar o nome da disciplina. Teologia, e surge nova discussão, Elsa Hartley Lucas sugere um título mais apelativo para a cadeira; profetas e mitos - porque não?! A sugestão é anotado no caderninho da Teresa que tenta dar seguimento às apresentações. O relógio não pára mas as conversas são como as cerejas e a reunião começa a estender-se. Quando a ordem parece restabelecida, as atenções dispersam-se uma vez mais, porque o novo elemento da UNICA, Maria Madalena, dá entrada na sala. É impossível continuar com as apresentações sem que todos os olhos se virem para a menina de 4 meses. A Maria Madalena tem um penacho que se ergue no topo do cucuruto, segue directamente para o colo da mãe Teresa como quem deixa no ar um ' não se incomodem por mim'.
Lino Madruga ensina cavaquinho / viola e tem das aulas mais preenchidas da UNICA. O professor confessa que escolher repertório que agrade aos alunos não é fácil. É inquestionável a sua dedicação e comprova-o o número significativo de inscrições este ano, é possível que tenha de se desdobrar. Aliás, se os alunos se desdobram em várias disciplinas que lhes captam o interesse, também os formadores se lançam em diversos desafios e com diferentes turmas. Dora a professora de dança, implementa este ano, ballet para crianças até aos 7 anos. É importante que os mais pequenos conheçam e explorem a liberdade de movimentos, e os olhos brilham quando remete para o ambiente criativo e surpreendente das aulas. O mesmo não se aplica aos arraiolos, Maria Martins lembra que não se pode inventar muito, é uma arte exacta como a matemática, as contas têm de bater certas ou é preciso desfazer o trabalho. Já na pintura, disciplina da alçada da Rosa Bandeira, deixam-se fluir cores, formas e texturas numa arte assumidamente terapêutica.
A UNICA tem sido nos últimos 5 anos, ponto de confluência de muitas pessoas que se reencontram criativamente através do teatro, música, canto ou artes plásticas. Os sorrisos adornam os rostos de mais de uma centena de alunos, muitos viveram em função dos outros, mas está na hora de se lembrarem deles próprios. Não há limite de idade para o saber mas ficamos com a sensação de que têm um conhecimento sem limites das leis da vida.
Andreia Garcia e Teresa Matos não têm poupado esforços para o crescimento da UNICA, que este ano assenta arraiais ao nº1 da Rua Mário Casimiro com direito a instalações próprias. Parece tudo encaminhado, o ano lectivo está quase a começar e desenha-se no nosso mapa emocional tantas caminhos para ser feliz.